Salvo por disposição contatual expressa, os planos de saúde não são obrigados a custear o tratamento médico da fertilização in vitro.
Essa foi a tese aprovada por maioria de votos pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que nesta quarta-feira (13/10) encerrou o julgamento de três recursos especiais sobre o tema, afetados para definição de tese sob o rito dos recursos repetitivos.
Os processos tratam de de mulheres que, com dificuldade para engravidar, tiveram recomendado por seus médicos a fertilização in vitro. Duas sofrem com endometriose e uma, de hidrossalpinge (condição relacionada à endometriosa). Por conta disso, têm baixa reserva ovariana.
A tese aprovada foi proposta pelo ministro Marco Buzzi, relator dos recursos, e já era observada tanto pela 3ª Turma quanto pela 4ª Turma, que julgam matéria de Direito Privado.
Formaram a maioria com ele os ministros Marco Aurélio Bellizze, Luis Felipe Salomão, Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e Ricardo Villas Bôas Cueva.
Abriu a divergência o ministro Moura Ribeiro, que ficou vencido ao lado do ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Para eles, não há previsão legal que desobrigue as operadoras de plano de saúde de custear tratamento de fertilização in vitro.
E a lei?
Toda a problemática em torno do tema é causada porque não há disposição em lei para tratar especificamente da fertilização in vitro, mas apenas da inseminação artificial. E elas são técnicas distintas.
Na primeira, o embrião é criado em laboratório (bebê de proveta) e inserido posteriormente na mãe. Na segunda, o procedimento é mais simples: o sêmen masculino é inserido artificialmente no corpo da mulher e a natureza se encarrega da fecundação.
O artigo 10, inciso III, da Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/1998) expressamente exclui o procedimento inseminação artificial do plano-referência a ser observado pelas operadoras, medida que é reproduzida em resoluções normativas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Já o artigo 35-C da mesma lei diz que é obrigatória a cobertura do atendimento nos casos de planejamento familiar.
Para delimitar o alcance da expressão “planejamento familiar”, a ANS editou a Resolução 192/2009, que em seu artigo 1º, parágrafo 2º, indica que a inseminação artificial e o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar não são de cobertura obrigatória.
Para o ministro Marco Buzzi, não há logica que o procedimento médico de inseminação artificial seja, por um lado, de cobertura facultativa e que, por outro, a fertilização in vitro, que possui características complexas e onerosas, tenha cobertura obrigatória.
Assim, permitir a interpretação abrangente acerca do “planejamento familiar” de modo a abarcar a cobertura da fertilização in vitro acarretará inegavelmente repercussão no equilíbrio econômico-financeiro do contrato de plano de saúde. “Não é um mero argumento. É um fato”, disse.
Alcance da normativa
Abriu a divergência o ministro Moura Ribeiro, para quem a normativa da ANS, a partir da já revogada Resolução 387/2015 — em vigor no momento dos fatos que embasam os processos — agiu além dos limites da lei para desobrigar as operadoras de arcar com os custos de tal procedimento.
O artigo 20, parágrafo 1º, elenca quais exclusões são permitidas em relação à cobertura assistencial. O inciso III, por sua vez, cita inseminação artificial, detalha o procedimento e termina com o termo “entre outras técnicas”.
“A resolução desborda da legislação. A legislação fala em [excluir da cobertura a] inseminação artificial, e a fertilização in vitro não faz parte disso. Se o legislador restringiu apenas inseminação artificial, não tem como o Judiciário estender seu alcance”, afirmou o ministro Moura Ribeiro.
Destacou ainda que, quando a Lei dos Planos em Saúde foi feita e entrou em vigor, já se fazia fertilização in vitro no Brasil. “Se fosse intenção do legislador estender a restrição à fertilização in vitro, ele certamente o teria feito de forma textual. E não o fez”, complementou.
Fonte: JuriNews